quinta-feira, 10 de outubro de 2013

Eu Melhor no Direito Civil - Impenhorabilidade do Bem de Família


             



   Como estudiosa do Direito sempre aparece alguém com a famosa pergunta "Oi, você é formada em "advocacia"" né, posso tirar uma dúvida?".
Bem, não sou formada em "advocacia", lembrando que advogado é bacharel em direito que é aprovado no exame da ordem e exerce a nobre profissão, o que não é o meu caso, mas ficaria feliz em poder ajuda-lo caso saiba a resposta.
E uma das dúvidas que sempre surge é sobre Impenhorabilidade do Bem de Família, motivo pelo qual resolvi fazer este post, o qual dedico aos Corretores de Imóveis, Bacharéis em Direito, Advogados, Concurseiros e Empresários do Ramo Imobiliário.
Muitas pessoas acham que a casa jamais poderá ser penhorada. Será se existem exceções? Seguem as dúvidas mais corriqueiras: 


1 - O que é “bem de família voluntário” e o que é “bem de família legal”?
O bem de família VOLUNTÁRIO, previsto nos artigos 1.711 e seguintes do Código Civil, é aquele instituído por ato de vontade do casal (casado ou em união estável) ou por ato de terceiro e registrado no Registro de Imóveis (art. 167, I, 1, da Lei de Registros Públicos). Para instituir o bem de família voluntário na forma do Código Civil deve-se lavrar um instrumento constituindo aquele imóvel como bem de família e levar o registro ao cartório de imóveis. Exige, pois: manifestação de vontade e registro.
O bem de família LEGAL é aquele regulado pela Lei nº 8.009/90, a qual resguarda o bem de família de todos, independentemente de registro cartorário, consagrando uma impenhorabilidade legal independentemente da constituição formal e do registro do bem de família. O objetivo é proteger o imóvel por dívidas futuras, tornando o imóvel blindado pela impenhorabilidade legal.

2 - Qual é o alcance do bem de família LEGAL?
Conforme o art. 1º da Lei 8009/90, “o imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei.” No parágrafo único, diz ainda que “a impenhorabilidade compreende o imóvel sobre o qual se assentam a construção, as plantações, as benfeitorias de qualquer natureza e todos os equipamentos, inclusive os de uso profissional, ou móveis que guarnecem a casa, desde que quitados.” Portanto, todo imóvel, na forma desta lei, está protegido. A proteção é ampla. Envolve o imóvel, plantações, benfeitorias, equipamentos, bens móveis.

3 - Qual é a hermenêutica do STJ em relação ao parágrafo único do art. 1º da Lei 8009/90?
A proteção atinge vários bens; é ampla. Contudo, em mais de um julgado, interpretando o alcance do bem de família legal, o imóvel, em algumas hipóteses, pode ser desmembrado para efeito de penhora. Isso é limitar o alcance da norma. O STJ, em mais de uma oportunidade (REsp 206.693/SC, REsp 510.643/DF, REsp 501.122/RS) tem admitido o desmembramento do imóvel para efeito de penhora.

4 - Quais são os bens móveis excluídos da proteção da Lei 8009/90?
Segundo o art. 2º da Lei 8009/90, excluem-se da impenhorabilidade os veículos de transporte, obras de arte e adornos suntuosos. No caso de imóvel locado, a impenhorabilidade aplica-se aos bens móveis quitados que guarneçam a residência e que sejam de propriedade do locatário. Exemplos, na jurisprudência brasileira e doutrina, de bens móveis protegidos pela Lei 8.009: Freezer, máquina de lavar, máquina de secar, computador, televisão, ar-condicionado. No REsp 218.882/SP o STJ entendeu que a proteção se estende a instrumento musical (teclado): “A música é essencial em uma sociedade marcadamente violenta como a nossa. E não seria um simples teclado que iria reequilibrar as finanças do banco. O teclado fica.”

5 - Vaga de garagem é protegida pela Lei 8009/90?
O STJ já consolidou que vaga de garagem com matrícula e registro próprios é penhorável (agravo regimental do agravo 1.058.070). A garagem, se tiver registro separado, vai ser penhorada. Se estiver conjugada com a área privativa do apartamento, está protegida. A questão é investigar se há matrícula e registros separados ou não para efeito de penhora.  Segundo o STJ: “Está consolidado nesta corte, o entendimento de que a vaga de garagem desde que com matrícula e registro próprios pode ser objeto de constrição não se lhe aplicando a impenhorabilidade da lei 8009/90.”

6- Quais são as exceções à impenhorabilidade do bem de família legal?
As exceções são aquelas trazidas pelo art. 3º da Lei 8009/90. Doutrinariamente, entende-se que essas exceções, que são de ordem pública, devem ser aplicadas também ao bem de família voluntário, sob pena de se abrir uma grande brecha para fraudes no direito brasileiro:
“Art. 3º A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido:”
“I - em razão dos créditos de trabalhadores da própria residência e das respectivas contribuições previdenciárias;” OBS.: Ficou assentado no REsp 644.733/SC, no que tange à interpretação do inciso I, do art. 3º, que trabalhadores ou empregados eventuais, como pedreiro, eletricista ou pintor não estão abrangidos pela exceção legal. O inciso I refere-se a empregados que tem permanência. Trabalhadores meramente eventuais, não estão abrangidos pela exceção legal.
“II - pelo titular do crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato;” Se o agente financeiro financiou a construção ou a aquisição de usa casa própria não dá para opor contra ele um bem de família.
“III -- pelo credor de pensão alimentícia;” Não haverá proteção contra bem de família se o processo foi movido pelo credor de pensão alimentícia. A esposa ingressou com execução, o apartamento do ex-marido devedor pode ser penhorado.
“IV - para cobrança de impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições devidas em função do imóvel familiar;”
É o caso do processo movido para cobrança de impostos (predial ou territorial), taxas e contribuições devidas em função do imóvel. Esse inciso IV se baseou no conceito de tributo (imposto, taxa e contribuição) e diz que não há proteção do bem de família se o processo foi movido para pagamento de imposto devido em função do imóvel (IPTU, ITR, etc.). A exceção da lei refere-se à cobrança de tributos vinculados ao imóvel.
OBS.: O Supremo Tribunal Federal já firmou entendimento, seguido pelo STJ, no sentido de que a cobrança de taxa de condomínio resulta também na penhora do imóvel (RE 439.003/SP). Condomínio não é tributo, mas o STF deu uma interpretação extensiva pelo fundamento de política social.
Eros Grau em RE: “A relação condominial é tipicamente relação de comunhão de escopo. O pagamento de contribuição condominial, obrigação propter rem, é essencial à conservação da propriedade, vale dizer, à garantia da subsistência individual e familiar à dignidade da pessoa humana. Não há razão para, no caso, cogitar-se de impenhorabilidade.”
Ou seja, se não pagou a taxa de condomínio, penhora o imóvel.
“V - para execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar;”
Então, se o casal ou entidade familiar, voluntariamente foi ao Bradesco pactuar um contrato de empréstimo, voluntariamente hipotecou o imóvel. Não pode vir, depois, dizer que se trata de bem de família. Isso viola o princípio do venire contra factum proprium. Na literalidade da norma, se o casal vai ao banco e hipoteca voluntariamente o apartamento não podem depois, contraditoriamente a isso, invocar a proteção do bem de família.
OBS.: O STJ, por outro lado, como se lê no agravo regimental REsp 813.546/DF, tem entendido que a simples indicação do bem à penhora não implica renúncia ao benefício da lei 8009/90. Está flexibilizando. Se o devedor numa execução indicou à penhora a casa dele, ele pode, depois, em embargos, desdizer o que disse antes. Parece ferimento ao venire, mas o STJ vem entendendo que é uma simples indicação de bem. Mas se vc hipotecou, é mais difícil porque a lei é muito clara.
“VI - por ter sido adquirido com produto de crime ou para execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens.”
Portanto, os efeitos civis da sentença penal condenatória podem atingir a sua casa.
“VII - por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.”
Este é o inciso mais polêmico. Fiador em contrato locatício não tem bem de família no Brasil. Carlos Veloso disse que esse inciso é inconstitucional. Mesmo que ele renuncie o benefício de ordem, cabe ação de regresso, mas ele não é o devedor principal. O Supremo Tribunal Federal, por seu plenário, já afirmou ser constitucional a penhora do imóvel residencial do fiador na locação (RE 352.940-4/SP).
A Súmula 364, do STJ, firmou entendimento no sentido de que a proteção do bem de família alcança, inclusive, devedores solteiros, separados e viúvos.” Ou seja, a pessoa que vive só também goza da proteção do direito de família. Há ementa de um recurso do STJ que trata disso: “A interpretação da lei 8.009/93 revela que a norma não se limita ao resguardo da família. Seu propósito é proteger o direito fundamental da pessoa humana. Não faz sentido proteger quem vive em grupo e abandonar o indivíduo que sofre o mais doloroso dos sentimentos, a solidão. É impenhorável o imóvel que reside sozinho o devedor celibatário.”

7 - Quais os efeitos que decorrem da inscrição no cartório de imóveis do bem de família VOLUNTÁRIO?
Os efeitos são: impenhorabilidade e inalienabilidade. A partir do momento que os instituidores registram o bem de família voluntário, ele se torna inalienável e impenhorável. Perde-se a liberdade de vendê-lo ou doa-lo como antes. Para fazer isso, é necessária a observância a certas formalidades, haja vista que existe uma restrição para preservar a finalidade do bem de família.
A inalienabilidade está prevista no art. 1.717, do Código Civil: “Art. 1.717. O prédio e os valores mobiliários, constituídos como bem da família, não podem ter destino diverso do previsto no art. 1.712 ou serem alienados sem o consentimento dos interessados e seus representantes legais, ouvido o Ministério Público.” Portanto, para vender o bem de família, tem que colher a manifestação de todos os interessados, não só da vontade do vendedor, mas também do seu cônjuge e, se houver incapazes, há intervenção do MP. Para poder vender, é preciso cancelar o registro do bem de família. “Registrado o bem de família voluntário, ele se torna impenhorável por dívidas futuras, com as ressalvas do art. 1.715.” Instituído o imóvel como bem de família voluntário, ele passa a ser impenhorável por dívidas futuras (é a proteção maior), mas há exceções: “Art. 1.715. O bem de família é isento de execução por dívidas posteriores à sua instituição, salvo as que provierem de tributos relativos ao prédio, ou de despesas de condomínio. Parágrafo único. No caso de execução pelas dívidas referidas neste artigo, o saldo existente será aplicado em outro prédio, como bem de família, ou em títulos da dívida pública, para sustento familiar, salvo se motivos relevantes aconselharem outra solução, a critério do juiz.” A impenhorabilidade que deriva da instituição do bem de família voluntário, como se vê, não é absoluta.

8 - Quais são as características especiais do bem de família VOLUNTÁRIO?
O novo Código Civil trouxe duas grandes inovações no tratamento do bem de família voluntário.
Nos termos dos artigos 1.711 e 1.712, no novo Código Civil, o bem de família voluntário tem duas características especiais:
a) O bem de família não poderá ultrapassar o teto de 1/3 do patrimônio líquido dos instituidores.
b) O bem de família poderá abranger valores mobiliários (inclusive rendas).




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